quinta-feira, 14 de junho de 2012

O Passeio Noturno Da Mulinha Caipira

A meia-noite de uma sexta-feira junina anunciava-se, friorenta e preguiçosa, enquanto a pequena mulinha caminhava despreocupadamente pela estrada de terra. Locomovia-se com vagar, pata ante pata, passeando tranquila pelos ermos sítios interioranos. Conhecia bem o caminho, utilizava-o noite após noite como campo de passeio para fortalecer os músculos de suas finas pernas atarracadas. Seu pelo cinzento brilhava na garoa fina, fazendo-a parecer, como alguns de seus colegas de fazenda haviam dito, um unicórnio cintilante. Não que soubesse, exatamente, o que diabos significaria parecer-se com um unicórnio cintilante. Mas parecia ser algo bom, no fim das contas. As galinhas que lhe confidenciaram isto possuíam um bom coração. E ela gostava de coisas boas, para falar a verdade. Coisas boas faziam a vida boa, como aquela boa caminhada noturna, na mais completa e deliciosa solidão.

E lá estava a nossa amiga mulinha aproveitando ao máximo sua própria companhia quando eles apareceram. Vieram em algo luminoso e barulhento, rindo histericamente e fazendo grandes sulcos na terra molhada. Retiraram impiedosamente algumas pedras que serviam como ponto de base e encurralaram a pobre mulinha em uma ribanceira. Ela não sabia o que estava acontecendo, o que deveria fazer ou como sairia daquela situação. Aquilo definitivamente não era uma coisa boa. Não, realmente não era.

Com o coração acelerado, a mulinha deu alguns passos incertos até uma cerca de madeira. Seu coração disparara, precisava se recompor. Nunca antes havia passado por algo como aquilo. Quem seriam aqueles seres? O que será que eles poderiam querer com uma pacata mulinha como ela?

A máquina luminosa aproximou-se, deixando o som das gargalhadas e dos metais distorcidos mais alto. A mulinha contou pelo menos cinco seres escuros com olhos brilhantes dentro dela. O quê diabos seriam eles?

A mulinha lembrou-se, então, com o coração apertado, das histórias que seu colega peru contava antes de desaparecer por completo em uma véspera de Natal. Eram histórias sobre seres de outros planetas e das estrelas distantes do céu noturno que apareciam de tempos em tempos nas fazendas do mundo para sequestrar os animais e fazer experiências terríveis com seus cérebros e tripas ou expô-los em zoológicos intergalácticos sem comida decente por milhares de anos a fio ou até que morressem de fome.

"Meu Fazendeiro Divino!" pensou a mula "Estou prestes a ser abduzida por alienígenas!"

Um dos seres que estavam dentro da máquina luminosa abriu magicamente uma janela de vidro e colocou para fora um aparelho cintilante.

"É agora" pensou a mula fechando os olhos "Adeus, Terra. Adeus, fazenda. Adeus caminhadas noturnas. Adeus..."

Clique. Risadas. Roncos de motor. Silêncio.

A mulinha abriu hesitantemente os olhos. À sua volta, apenas as conhecidas árvores e pedras de sempre. A terra em que pisava estava um pouco bagunçada, é verdade, mas, fora isso, tudo na mais perfeita normalidade.

Ela não fora abduzida, no fim das contas. Mas uma experiência como aquela ficaria para sempre guardada em sua memória. Ela nunca mais seria a mesma. Aquela mulinha tranquila e pacata que gostava das coisas boas da vida havia acabado de morrer.

...

Daquele dia em diante, a mulinha passou a intitular-se A Enviada Do Fazendeiro Divino e pregar insistentemente que o Fim do Mundo estava próximo e todos os que não se arrependessem de seus pecados e aceitassem a palavra divina do Fazendeiro seriam levados pelos Terríveis Alienígenas Gargalhantes para o outro lado da galáxia e arderiam eternamente em plantações de cana extraterrestres até o dia do Juízo Final.


XD

Um comentário:

  1. Hhahahahahahhahah SENSACIONAL!!! Parabéns, Karol!!! Coitada da Mulinha, não vou mentir, um dos seres teve pena dela, tenho certeza, segundo informações ele já teve vida em fazendas e sítios e sabe do desespero dos animais quando encontram determinados seres malucos!!!

    Fazendeiro divino foi demais! rsrsrsrsrs

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