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quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Tutorial De Como Matar Uma Mariposa Gigante

Esta bela e trágica história se passou nos idos anos de 2008, no mês de Outubro. Já postei antes no antigo Idéias Mais Mirabolantes, mas eu precisava publicá-la aqui mais uma vez. É sempre atual. XD

...

Estávamos nós, eu e Thiago, calmamente sentados no sofá da casa da minha avó em Águas de São Pedro, altas horas da madrugada, assistindo ao Novo Tele Curso – que, aliás, é realmente muito novo, diga-se de passagem; as placas dos carros que passavam na gravação ainda eram amarelas, os ônibus eram brancos com uma linha vermelha no meio e as pessoas usavam aqueles penteados cheios lindos do começo dos anos 90 e aquelas calças de cintura alta coloridas – quando, de repente, eis que essa que aqui vos escreve nota alguma coisa muito preta e muito nojenta delicadamente (?!) pousada no vidro da janela.


— Thi... Aquilo ali é uma barata ou uma borboleta? — perguntei, temendo a resposta.

Como todos bem sabem, eu tenho um certo, hum, como poderia dizer?, receio de borboletas.
Na verdade, não é bem um receio.
É medo, mesmo.
Pavor.
E não tem explicação nenhuma pra isso, exceto que minha avó também tem.
Já me disseram que, de acordo com a psicanálise, pode ser que esse meu pé atrás em relação às borboletas (escrever aqui “meu pavor de” seria mais correto, mas faria com que me sentisse idiota, então, deixa pra lá) e qualquer coisa que voe de maneira geral seja porque eu tenho inveja da liberdade que esses animais têm por poderem voar.
Talvez.
Mas se voar for mesmo só uma questão de errar o chão, então...
Ah, deixa pra lá.
Voltando ao que aconteceu.

— Thi... Aquilo ali é uma barata ou uma borboleta?

— Acho que é uma borboleta... ai, não, acho que é uma mariposa!

Foi o tempo de processar a palavra “mariposa” e ligar o nome ao bicho que os dois corajosos urbaninhos puseram-se de pé num pulo e foram refugiar-se no extremo oposto da sala, quase que atrás da mesa.

— E agora? Você vai matar? — perguntei, em meu desespero crescente.

— Matar isso aí? Ai. Tem SBP? Ai.

Bom ter um namorado que tem tanto medo de mariposa quanto eu.
Lá foi a garota do cabelo roxo desbotado em busca da salvação e do alívio que se materializavam em um vidro de SBP.

— Olha, tá aqui. E o pano. — eu disse, entregando-lhe as armas, assumindo uma expressão de “eu confio que você vai voltar vivo” digna de esposa de soldado em véspera de batalha e tratando de sair rapidinho dali.

Pobre Thiago. Foi-se chegando de mansinho ali perto da janela, entrincheirando-se atrás do sofá, as armas em punho, uma expressão de determinação no rosto. Engatilhou o vidro de SBP e disparou uma, duas, três vezes, dando um passo para trás a cada vez que a mariposa esboçava qualquer sinal de tentar se mexer.

— Ô Thi... acho que você tem que espirrar mais em cima dela, não? — balbuciei do meu esconderijo na cozinha.

— Tô tentando!! — disse ele, e espirrou uma quarta vez. Oh, céus. Para quê. E não foi que a mariposa maldita resolveu levantar vôo?

Não deu nem uns três segundos e eu já estava escondida atrás da porta da lavanderia, com um cachorro poddle preto com cara de sono a me observar desaprovadoramente e um sentimento nada propício de que não deveria ter deixado meu pobre namorado lutando sozinho com aquele monstro.
Cadê sua coragem, Carolina!
Juntei minhas forças, ou o que sobrara delas, e voltei para o campo de batalha.

— Thi?

— É melhor você ficar aí. Ela tava voando; agora tá pendurada no sofá.

— Ai. Vou tentar abrir a porta pra ela sair!

Brilhante idéia, Carolina. Brilhante. Como você pretendia fazer aquilo sem passar por aquele monstro mutante?
Mas lá fui eu, exemplo da coragem feminina, pulando a qualquer tremida de asas da mariposa, abrir a porta. E consegui sair ilesa da missão, vivas para mim! Entretanto, quem não quis entrar na brincadeira foi a mariposa. Lá ela continuou, pousada no sofá, parece que zombando das nossas tentativas frustradas de fazê-la ir embora.

— Taca mais SBP! — eu disse.

Acabamos com o vidro de SBP; nada. Busquei outro. No que o Thiago abriu o frasco aquele demônio alado, talvez prevendo outra tentativa homicida da nossa parte, abriu suas enormes asas negras e amareladas e partiu para cima do coitado.

— AH! AHHH! ELA TÁ ME ATACANDO!!!

— AAAAHHHHH!!!!

Corremos para a cozinha. De lá, observávamos a astúcia da mariposa, voando calmamente pela sala. Depois de algum tempo, ela se escondeu em baixo da mesa.

— É agora! — eu disse — Mais SBP!

Espirramos mais SBP naquela mutação genética, que começou a se debater freneticamente. Esboçou mais algumas tentativas de vôo, frustradas pelo veneno, e pôs-se a cambalear pelo chão da sala.

— Ah, agora fica mais fácil, né? — eu disse.

— É, né... — respondeu o Thiago, e ficou me olhando — Mas ela ainda tá fugindo.

Depois de algumas tentativas frustradas de tiro ao alvo com meus chinelos, eis que Thiago teve a brilhante idéia de jogar o pano em cima da mariposa.

— Você joga — falei.

E ele jogou. Acertou em cheio as asonas pretas e nojentas da mariposa.
E lá ficou, aquele monstro diabólico e perverso, debatendo-se debaixo do pano de chão sujo.

— Você vai pegar a bichinha? — perguntei, suplicante, mas já sabendo a resposta.

— Há. De jeito nenhum. Deixa ela aí!

Mas eu não podia deixá-la ali.
Ela se debatia, o pano mexia, começava a me dar uma agonia danada de ver a agonia da pobrezinha.
Sim, ela era um monstro vindo direto do inferno, mas, ainda assim, a hora da morte de qualquer ser vivo deve ser respeitada.
E foi por isso, por piedade, que eu não tive dúvidas e pisei em cima do pano. Uma, duas, três vezes. Dancei um sapateado romeno em cima da bicha, até ter certeza de que ela não iria se mexer mais.

— Pronto. Agora você pega? — perguntei.

— Eu, heim!! — respondeu Thiago se afastando.

Então, como não havia mais jeito, fiz eu o trabalho sujo de me livrar do corpo. Deitei-o no jardim, com pano e tudo, da maneira mais rápida e limpa que pude encontrar.

E foi assim que se deu a batalha épica de dois urbaninhos guerreiros e extremamente corajosos com um terrível monstro alado saído direto dos últimos círculos do inferno.
Por favor, crianças, não tentem isso em casa. Um negócio desses pode causar danos psicológicos irreversíveis...

E fim.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

A Ladra Do Bastão Defumador Do Deus Das Borboletas.



Horário de expediente. Conto as horas no relógio, que parece ter feito um curso de lentidão para tartarugas e move-se como se estivesse debaixo d'água. Dia tranquilo, porém tedioso - pra variar.


Resolvi fumar um cigarro no jardim. Ah, o jardim. O único espaço do meu local de trabalho onde as vibrações astrais não estão doidas para a qualquer momento pular em seu pescoço com uma navalha bem afiada. Um agradável e ensolarado jardim, cheio de plantas e passarinhos e flores e borbol... BORBOLETAS!?

Hum, certo. Não tenho problema com borboletas. Borboletas são bonitinhas, são como fadinhas cintilantes e coloridas que surfam nas brisas do entardecer.

Sim, sim, borboletas bonitinhas, muito fofinhas. Cuti-cuti.
Fiquem aí, certo? Quietinhas, batendo suas asinhas psicodélicas a uma boa distância desta pseudo-hippie do cabelo despenteado que só queria um momento de paz e tranquilidade feito de tabaco enrolado vendido em maços a quatro reais e setenta e cinco centavos.

- Olha! - diz uma borboleta vermelha com pintas pretas para sua colega Amarelinha - O Bastão Defumador Do Deus Das Borboletas!

- Hã? Onde? - responde em polvorosa a Amarelinha.

- Ali, nas mãos daquela moça de saia azul! Olha como a fumaça azulada que sai dele cintila na luz do Sol! Ou ela roubou o Bastão Defumador do Deus das Borboletas ou ela própria é o Deus das Borboletas!

- Ah! Mas ela não tem cara de Deus das Borboletas. As asas dela são muito murchas, e ela não é multicolorida.

- Então ela só pode ser A Ladra Da Profecia Que Dizia Que Um Dia Uma Moça De Saia Azul Roubaria O Bastão Defumador Do Deus Das Borboletas! É nossa missão resgatá-lo!

- Vamos chamar reforços!

Surgindo de todos os buracos possíveis deste jardim, e com um brilho vermelho no olhar (?), as borboletas voaram com intenções homicidas para cima desta que vos escreve.
Joguei o Bastão Defumador Do Deus Das Borboletas no cinzeiro e corri o mais rápido que pude, entrando em minha sala e fechando a porta de vidro estrondosamente atrás de mim.

As borboletas, vitoriosas, ainda estão lá, pairando em volta do Bastão Defumador, entoando cânticos de louvor ao seu deus e com metralhadoras e granadas de pólem apontadas e preparadas para destroçar qualquer um que ouse se aproximar.


***

Ter medo irracional de algo inofensivo é o jeito mais fácil de parecer a pessoa mais idiota do mundo em apenas alguns segundos.
Fikdik.