No meio da sala, sentada de pernas cruzadas e iluminada pela inconstante luz colorida dos pisca-piscas, a moça fitava inexpressiva a árvore de Natal. Segurava nas mãos finas de unhas bem feitas uma garrafa de champanhe pela metade e um cigarro de filtro branco apagado. Sentia-se entorpecida.
Era Natal, mais uma vez. E, mais uma vez, passaria esta data sozinha.
Completamente sozinha.
Não sabia por quê diabos sentia-se tão mal. Ela mesma sempre dissera a quem se propusesse a ouvir que o Natal não passava de mais uma data como outra qualquer, especial apenas para as lojas de brinquedos e comércios em geral que faturavam milhões com a propaganda consumista do tal do Papai Noel.
Mas todo ano era a mesma coisa. Dezembro se aproximava e, com ele, uma nostalgia gigantesca que fazia inclusive com que ela decorasse seu apartamento com a temática natalina.
Talvez esse sentimento fosse culpa da saudade que sentia dos Natais da sua infância, pensou ela, quando tudo era mais colorido e tinha gosto de caramelos açucarados.
Lembrava-se da confusão da família reunida, das conversas animadas, dos primos correndo para lá e para cá no quintal enorme da casa da avó.
Mas a avó morrera, os primos cresceram, os desentendimentos vieram e ela se viu passando as festas, ano após ano, cada vez mais sozinha.
Cada vez mais sozinha.
E seu temperamento também não ajudava, de fato. Precisava, mesmo, ser tão rude com qualquer um que ousasse se aproximar? Passara por bons bocados quando mais nova, de fato, e erigiu muralhas de sarcasmo e arrogância para separá-la da dor. Mas agora via-se presa atrás dessa fortaleza costumeira e sequer tinha ânimo para tentar dela se desvencilhar.
Suspirando, bebeu outro gole de champanhe.
(Era sua terceira garrafa.)
“Esse ano será diferente”, pensou ela. “Vou ser menos egoísta. Vou me aproximar mais das pessoas. Vou voltar a falar com a minha irmã. Vou...”
E então um riso seco, irônico, rasgou-lhe os lábios. Era sempre assim, todo santo ano a mesma coisa. A “Crise do Natal”. Ficava melancólica, refletia languidamente sobre sua vida, chegava às mesmas conclusões que então chegara, planejava mudanças, embebedava-se. E, no ano seguinte, continuava exatamente igual. Arrogante, sarcástica, egoísta. Sozinha.
Abriu outra garrafa de champanhe e bebeu quase todo o conteúdo de uma vez só, pensando que daquela vez seria diferente. No ano seguinte ela seria, sim, uma nova pessoa e aquela seria realmente a sua última crise de Natal.
Adormeceu ali mesmo, no meio da sala, rodeada de garrafas vazias e cigarros apagados.
...
No dia seguinte, comprou um cachorro.