sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Uma terça-feira num bar


Na mesa do bar, em meio a garrafas vazias e cigarros apagados, a moça de cabelos claros fitava o vazio.

A névoa ambiente embaçava as figuras já meio desfiguradas que pulsavam à sua volta: sorrisos sem rosto, vozes sem boca, mãos sem corpo.

Pensamentos sem mente.

Piscando os olhos negros muito maquilados, a moça bebeu mais um gole de cerveja.

Já havia passado da conta, ela sabia; mas pequenas porções de melancolia etílica ajudavam-na a persistir.

A sentir.

Sentira-se entorpecida a vida toda, de qualquer forma.

Sóbria, o desequilíbrio e a contradição eram constantes, incontroláveis.

Entorpecer-se com substâncias manipuladas ao menos fazia com que recuperasse o controle da situação:

Sabia exatamente quantos copos precisava para alcançar determinado ponto de insanidade  no cotidiano, porém, não contava com qualquer tipo de medição.

Era por isso que estava onde estava.

No bar.

Em plena terça-feira.

Custava-lhe, no dia-a-dia, adequar-se ao sistema da vida que lhe fora imposta sem que ninguém lhe perguntasse se estava de acordo ou não.

Era-lhe penoso tentar se enquadrar ao que o mundo queria que ela fosse quando nem ela mesma era capaz de saber quem queria ser.

Passou a mão repleta de anéis nos cabelos e permitiu-se acender um último cigarro.

Acendeu um último suspiro.

– No fim, tanto faz – disse ela, entre anéis de fumaça – Algumas vezes, voar é só uma questão de errar o chão.


...

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